O barulho da bengala anuncia sua chegada.
Faz alguns anos que ela participa dos encontros de Arteterapia no museu que trabalho onde semanalmente a vejo. Com um sorriso, a recebo numa tentativa de apagar a sensação de estranhamento que ela evidencia em seu rosto ao chegar a um ambiente que ela não reconhece.
-Dona Flora! Que bom que a senhora veio pintar aqui no museu!
Ao recebê-la desta maneira, sei que proporciono certo alivio para sua inquietação e insegurança. Não deve ser fácil chegar a um lugar que não fazemos ideia qual seja e muito menos o que iremos fazer ali.
Dona Flora então, me reconhece afetivamente e ao me abraçar sempre diz: Ah! É você! Que bom! Eu te amo muito!
A verdade é uma só: O Alzheimer apaga memórias, mas não destrói os afetos construídos e isso conforta e mostra caminhos para driblar a patologia que insiste em realçar as perdas funcionais e cognitivas.
A Arteterapia é uma conduta eficaz na construção de relações afetuosas entre o profissional e o idoso e entre o idoso e a própria arte. Envolve-los com propostas relevantes, com a historia da arte e com um fazer artístico prazeroso e possível de ser concretizado, é um meio de enfatizar algo inversamente proporcional à doença.
Dona Flora já vive o avanço do Alzheimer e muito facilmente se perde ao executar as propostas. O papel do profissional de Arteterapia é estimular a percepção dos passos que devem ser dados através de uma fala clara, direta e de um estímulo artístico capaz de afetar o idoso.
Temos Matisse, Monet, Van Gogh e outros tantos a nosso favor e mesmo que o entendimento cognitivo esteja prejudicado, a Arte fala por entrelinhas, muitas vezes, de maneira imperceptível. E o que não é evidente sob a luz da razão se faz eficiente na percepção e reação que acende olhares e dilui angústias causadas por uma doença que destrói historias, mas não apaga o sujeito existente.
A essência vai além da patologia e esta é a aposta da Arteterapia que oferece estímulos cognitivos através de condutas que favorecem a vida e não a doença. Para enfrentar o Alzheimer, o foco precisa estar na vida. A Arteterapia é uma intervenção que vale à pena tornar-se conhecida